domingo, 19 de dezembro de 2010

DISTÂNCIA


Quis o destino que a distância um dia
Abrisse em fenda o chão que nos unia
Quis tal destino o fim do nosso sonho
Precipitado em abissal medonho.

Se essa distância homérica enlouquece

É nesse abismo que minha alma desce
Envolta em minhas lágrimas doridas
E encontra as lágrimas por ti vertidas.

Mesmo distante uno-me a ti em pranto
Na angústia que nos priva de acalanto
Na busca da paixão que esta alma roga

Com fios destas lágrimas tecemos
O lago de saudade em que vivemos
O mar da solidão que nos afoga!

Oldney Lopes ©

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

PROCURO A PALAVRA PALAVRA


Não é a palavra fácil
que procuro.
Nem a difícil sentença,
aquela de morte,
a da fértil e definitiva solitude.
A que antecede este caminho sempre de repente.
Onde me esgueiro, me soletro,
em fantasias de pássaro, homem, serpente.

Procuro a palavra fóssil.
A palavra antes da palavra.

Procuro a palavra palavra.
Esta que me antecede
e se antecede na aurora
e na origem do homem.

Procuro desenhos
dentro da palavra.
Sonoros desenhos, tácteis,
cheiros, desencantos e sombras.
Esquecidos traços. Laços.
Escritos, encantos reescritos.
Na área dos atritos.
Dos detritos.
Em ritos ardidos da carne
e ritmos do verbo.
Em becos metafísicos sem saída.

Sinais, vendavais, silêncios.
Na palavra enigmam restos, rastos de animais,
minerais da insensatez.
Distâncias, circunstâncias, soluços,
desterro.

Palavras são seda, aço.
Cinza onde faço poemas, me refaço.

Uso raciocínio.
Procuro na razão.

Mas o que se revela arcaico, pungente,
eterno e para sempre vivo,
vem do buril do coração.


Lindolf Bell
em "O Código das Águas"

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

NO MEIO DA RUA



Hoje saí para tomar chuva.
Deixei a água do céu lavar minhas impurezas.
Deixei meu pensamento voar livre,
Enquanto a chuva molhava meu corpo.
E no meio da rua me despi
De preconceitos,
Anseios,
Receios.
No meio da rua me despi
Da brutalidade,
Vulgaridade,
Comodidade.
No meio da rua me despi
Da intransigência,
Incoerência,
Ambivalência.
Deixei-me ficar completamente nua,
Pois no meio da rua me despi
Da covardia,
Agonia,
Asfixia.
Quando voltei para casa
E me olhei no espelho,
O que restou
Era poesia.


Lígia Spengler

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

TORTURA



Não agüento mais viver este tormento,
Esta dor alucinante.
Anjos e demônios, em mim, guerreiam,
Duelando pelas minhas vontades.
Neste momento, sou espírito,
Daqui a pouco, posso ser pura carne.
Por isso, se numa hora te chamo,
Na outra, ordeno que partas.
Numa hora eu fujo assustada,
Na outra, saio louca ao teu encalço.
Essa dualidade me consome.
Essa tortura me mata,
Me deixa insana.
A te querer, prefiro a morte!
Mas que a morte seja nos teus braços!

Lígia Spengler