segunda-feira, 19 de abril de 2010

Morada


Moro nas retinas do poeta que sonha

No ardor do corpo que estremece

Na beleza da criança risonha

No cansaço que, de repente, adormece.


Moro na magia do dia que nasce

No encantamento do sol se pondo

Na esperança perdida que renasce

No medo que, aflita, escondo.


Moro nas flores que perfumam teu caminho

No vento suave que afaga tua face

Na emoção do sonho que acarinho

Na altivez que não permite que eu me amordace.


Moro nas águas do rio que te refrescam

No sagrado alimento que te sacia

Na bravura daqueles que pescam

Na alvura da pele macia.


Moro nas folhas molhadas de orvalho

No calor que afogueia o rosto

No desejo que, insana, amortalho

No espírito arrasado e recomposto.


Moro na curva da estrada bendita

No sorriso que, repentinamente, enternece

Na força daquele que acredita

Nas mãos que se unem em prece.


Moro no ar que tu respiras

Na música que nos dá saudade

Na grandeza daquilo que mais aspiras

No imenso encanto de uma amizade.


Moro em todo canto, em cada parte,

Em cada vislumbre de magia

Moro naquele que nada tem e ainda reparte

Moro em ti, pois meu nome é POESIA.


Lígia Spengler

Última Inspiração


Enquanto o homem trabalha, corre e se cansa

Na luta diária, na busca frenética,

Louca e sem esperança...

O poeta descontente se esconde,

A inspiração que tão fácil lhe aflorava

Simplesmente já não responde...

O poeta morre lentamente

De forma contundente,

Pelas palavras esquecidas na gaveta,

Na estante, na mesa, na alma, no coração...

Vendo o tempo escorrer pela ampulheta,

Chora os sonhos perdidos na sua acomodação.

O poeta sensível, de pena instigante,

Torna-se vazio, desabitado da poesia...

Ele, que já fora dono da palavra cativante,

Vê que agiu de forma insana e perdeu toda a magia...

Então, quer retornar, voltar ao ponto de partida,

E acha que pode, e pensa que ressuscita,

Mas no último suspiro, sem alarde,

Entre as lágrimas que escorrem,

Em lenta agonia, percebe ser muito tarde...


Lígia Spengler